Resenha: Lenine – Chão

Álbum: Chão

Artista: Lenine

Lançamento: 19 de outubro

Selo: Universal

Ouça: soundcloud.com/bruno-giorgi/lenine-ch-o

Rockometro: 8,5

Osvaldo Lenine Macedo Pimentel ou como acabou conhecido em boa parte do país, Lenine, é de longe um dos personagens mais notórios da música brasileira. Do nascimento musical pouco badalado no começo dos anos 80 para a aceitação do público e (principalmente) da crítica ao longo de toda a década de 1990, o pernambucano de Recife foi lentamente solidificando uma das mais imponentes discografias e carreiras que se desenvolveram ao longo das últimas décadas, quebrando qualquer tipo de barreira comercial ou radiofônica para em diversas vezes manter um profundo e conexo diálogo com o grande público.

Mantendo a boa forma de seus primeiros (e elogiados) lançamentos, como Olho de Peixe de 1993 e O Dia em que Faremos Contato de 1997, Lenine apresenta agora seu mais novo registro de estúdio, Chão, um trabalho que (in)voluntariamente surge para reforçar a imagem do cantor e compositor como um dos mais relevantes e inovadores de nossa música. Menos óbvio que o anterior trabalho do músico – Labiata, de 2008, álbum que acabou gerando expectativas mediante sua posição pós-Acústico MTV -, o presente disco transpira um profundo toque de inovação, com o pernambucano materializando uma soma de elementos que se desvencilham das obviedades da MPB e percorrem caminhos quase experimentais.

Essencialmente metafórico e carregado de subjetividades, o registro se solidifica inteiro no bem posicionado jogo de versos que conectam o músico (e os personagens de suas letras) diretamente ao chão que dá título ao trabalho. O resultado desse emprego hábil de distintas exposições líricas – em sua maioria afundada em uma intensa camada de melancolia – acaba resultando em um trabalho forte, em alguns momentos até soturno, com o cantor abandonando quase por completo qualquer tipo de ligação com o mesmo tipo de música suingada e abrasileirada de outrora, caminhando assim em um terreno novo, e por que não, instigante.

Dos passos acelerados em chão de pedra que delimitam a faixa título, passando pela respiração sufocante de “Se Não For Amor, Eu Cegue” até o som da derrubada de uma árvore em “Envergo Mas Não Quebro”, grande parte do que garante beleza e inovação ao disco vem diretamente da captação de ruídos e sons naturais que acabam entrecortando o registro. Orgânico em todos seus aspectos, Chão se desenvolve como um projeto vivo, como se todos os elementos que brotam da terra dessem formas ao catálogo de 10 composições que caracterizam o disco. Um jogo de faixas que estão para muito além de meros aglutinados sonoros, mas sim, canções dotadas de vida própria e uma unidade musical única.

Oposto das anteriores obras do músico, o recente trabalho parece manter como seu elemento central e de distinção a unidade entre suas canções. Cada faixa presente no disco não está ali à toa, pelo contrário, faz parte de uma trama maior, como se todas as composições presentes no registro fossem parte de uma única e extensa faixa, uma música de exatos 28:05 minutos – algo pequeno perto da extensão dos anteriores trabalhos do compositor. Dessa forma, o álbum exige uma audição apurada do princípio ao fim, como se a máxima compreensão do registro estivesse no todo e não em suas divisões.

Estranho observar, que mesmo ausente de bateria em toda sua extensão é possível passearmos por todo o registro sem que a carência de tal elemento acabe se manifestando. Algo facilmente explicado pela grandiosidade de outros elementos que acabam se concentrando no interior do registro. Embora seja de fato um trabalho complexo, talvez a maior obra do cantor até o presente momento, nomear Chão como o registro máximo do músico talvez seja um erro, afinal, como bem aprendemos, a obra de Lenine é sempre marcada pela rotatividade e suas constantes evoluções, com o presente álbum sendo apenas uma abertura para outras futuras obras tão memoráveis quanto esta.

Cleber Facchi é a principal cabeça pensante do Miojo Indie