Resenha: Cat Power e Oneyedcats @ Circo Voador, Lapa-RJ 21/05/2010

Texto: Marcos Xi
Fotos: Juliana Ribeiro
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Em cada proporção, a noite era de divas. Se de um lado, a musa cool brasileira segurava um microfone da clássica época que as rádios dominavam a comunicação no mundo, a atração principal trazia jovens que deveriam ter 8 ou 6 anos quando seu primeiro álbum foi lançado. Era um domínio feminino musical em cima do palco tradicional da Lapa, onde o poder das gatas estava com uma loira e uma moça um pouco mais ‘fofa’.

Para quem ia chegando, não se esperava ver o Circo Voador lotado. O Oneyedcats – banda de Clarah Averbuck – tocou para uma ainda tímida e vazia platéia, enfrentando conversas altas e desrespeitosas ao belíssimo som que o quinteto produz. Clarah propôs um Jazz refinado e sensual, só perdendo ao fato de, mesmo com a roupa de gala e um som ao estilo ‘trilha sonora para amores tórridos’, resolveu trocar uma usual taça de champagne por um copo de plástico com cerveja barata.

Assistidos de perto pelo produtor Rafael Ramos (cabeça pulsante da Deckdisc e seu novo selo, o Sempre Vigilante), elevaram ao clima dos restaurantes finos de Nova Iorque e surpreenderam uma platéia que, em maioria, nem sabia que teria um ato de abertura ao show principal. A voz de Clarah não chega nem perto das divas do Jazz, mas é sensual e tem a presença certa no palco. Os arranjos que a banda inseriu nas letras de sua vocalista só nos deixam desejosos pela espera do álbum debutante do Oneyedcats, esperado para esse ano ainda.

– Leves passos, como as pétalas de margaridas; suaves melodias com cara de pedidos de desculpas.

Os Djs do coletivo Pitada alegravam o público com Feist e Beirut, The Whitest Boy Alive e Interpol, enquanto as luzes iam se apagando. Lá fora, começava a cair uma chuvinha fraca, dando o clima perfeito e intimista que a noite pede. Entram os únicos integrantes da banda nessa turnê: o tecladista Gregg Foreman e o guitarrista Judah Bauer. Os burburinhos se dissipam e os namorados se juntam. Começa “Don’t Explain”, para aí sim, sob intensos aplausos, Cat Power iniciar o show que há um ano atrás deveríamos ter visto.

Chan Marshall desfila de uma lado para o outro, com um visível sorriso e alegria de estar em terras cariocas sem ter a pressão e responsabilidade de entreter uma platéia alheia ao que era mostrado no palco, como foi na turnê passada. Seus pés mal saíam do chão, fazendo algumas vezes um ‘moonwalk’ singular, além de cantar diretamente virada para o público, sem escolher um único canto para representar seus sentimentos musicais. Suas mãos e corpo desenham no ar movimentos não muito condizente com a letra na qual é cantada, mas com ares de sensualidade e parte tocante de toda a presença sentimental que tem no palco.

No repertório, canções de várias épocas de sua carreira e foco nas doces versões que compõem seus últimos petardos, Jukebox e Dark End of The Street, alguns acompanhados por gritos histéricos e cantos da platéia, como “The Greatest”, “Sea of Love” e “Satisfaction”; outros por simples palmas, como em “Silver Stallion” e “Metal Love”. Em “Anjelitos Negros”, seu conhecido perfeccionismo acabou por prejudicar um tanto a apresentação, ao forçar que a banda aumentasse o  sentimentalismo e o clima, enquanto brigava , em inglês e espanhol, com o iluminador do Circo Voador para que ele ligasse a luz da platéia. Foram 5 minutos assim.

Aliás, a tradiconal casa de show carioca conseguiu tirar uma qualidade de som surpreendentemente ótima para abrigar os fãs muitas vezes inconseqüentes que estiveram naquela aconchegante noite. No início do show, em bom português, algumas fãs gritaram a pejorativa palavra “gostosa” bem embaixo de Cat Power – mais de uma vez; não satisfeitos, um outro coro chato e insistente pertubou a paz do recinto com repetidos pedidos de “Please Play Guitar”, negado veementemente por Chan e posteriormente desaprovado pelo restante da platéia, com um belo “Please Cala a Boca!”. Cat ainda recebeu – com uma expressiva felicidade – um presente do público, estendeu por várias vezes a mão para aqueles que estavam mais a beira do palco e terminou o show com uma distribuição de margaridas – muito bonitas e cheirosas – ao público.

Apesar dessa triunfante volta às terras de São Sebastião, senhorita Chan Marshall encontrou alguns momentos de apatia no recinto devido às baladas densas e longas demais, pediu desculpas e, mesmo constando no setlist oficial, não se permitiu dar-nos um bis ao fim da noite – talvez pelo fato do show há um ano atrás ter sido o maior da turnê, talvez para terminar de maneira bela, hipnotizante e apoteótica, num final que respeita a qualidade de sua apresentação e sua contribuição a música mundial.