As pérolas nunca lançadas de Chico Science

Em 1991, antes do mais representativo disco das últimas décadas chegar às lojas (Da Lama ao Caos), Chico Science já se encontrava com Lúcio Maia e Dengue para fazer o som que, mais tarde, seria o principal mote do Manguebit. Antes de existir a Nação Zumbi, os três músicos e mais outros participantes formavam a banda Loustal (ou LousTown ou Lowstown), que mais tarde se uniu ao grupo de samba-reggae Lamento Negro, para então se transformar em Chico Science & Nação Zumbi.

Muitos músicos, produtores, artistas e admiradores faziam parte desse grupo de amigos que, naquela época, já sabia que estava fazendo parte de algo que iria revolucionar a música brasileira. Um dos participantes ativos desse grupo chama-se DJ Elcy, e era a pessoa que acompanhava todos os shows da banda, gravando tudo que é material possível, em qualquer mídia que fosse.

Foi então que, em pleno século XXI, o DJ decidiu pegar alguns desses sons gravados naquela época, transformar em mp3 e liberar, em boa qualidade, na internet – ou melhor, no seu perfil do Soundcloud. São duas  pérolas do Chico Science tocando com a Loustal, em 1992, e um remix de um dos primeiros registros da Chico Science & Nação Zumbi, a música “No Meio da Canela“.

Apesar de soar precária, a guitarra de Lúcio Maia faz uns arranjos completamente diferentes da música original. A canção em si já começa diferente da lançada posteriormente para o Brasil, com Science declamando um poema de William Blake por cima de barulhos de algo se quebrando e o ruído de parada cardíaca avisado por monitor de hospital – para só então entrar numa mistura de guitarras e baterias meio ska, mas totalmente rock’n’roll.

“Improviso” mostra a forte influência que o grupo de samba reggae Lamento Negro teve na banda. Aqui, Science conversa sobre “nós somos uma antena”, já dando a entender que em breve viria o manifesto Caranguejos com Cérebro, escrito por Chico Science e Fred Zero Quatro (do Mundo Livre S/A), no qual o símbolo é uma antena colocada na lama. Atrás da voz dele, viagens de guitarra e batucadas fazem do som algo ainda mais raro.

Essa é um bônus. Começa com o clássico solinho de guitarra que caracterizou até hoje a Nação Zumbi – aquele riff que se tocar em qualquer lugar, vai ser difícil encontrar um que não saiba a quem ele pertence. O remix então digitaliza a música e mistura “No Meio da Canela” com “Banditismo Por Uma Questão de Classe”, preenchendo tudo com gambiarras eletrônicas.

Mas DJ Elcy achou pouco liberar apenas essas preciosidades musicais e colocou no ar também uma vinheta feita pela Orla Orbe, primeiríssimo grupo de Chico Science e Lúcio Maia, gravada para a boate Misty, “recanto do underground de Recife”. Colado com essa vinheta, aparece Francisco de Assis França contando sua história, de como surgiu o apelido de Chico Science e suas primeiras ideias musicais. A história é contada em quatro partes.

Chico Science fundou várias bandas diferentes além do Nação Zumbi – como a Mundo Livre S/A – e participou de milhares de outros grupos que, infelizmente, não conseguiram seguir em frente. Diego Albuquerque, entendido demais da cultura pernambucana e também o homem por trás do Hominis Canidae, também participou do início do movimento MangueBit e conta no Alt Newspaper como Science, Maia, Dengue e Jorge Du Peixe conheceram Fred Zero4, tudo por intermédio do webdesigner H.D. Mabuse, o primeiro assessor do manguebit, colocando pela primeira vez o movimento na internet e divulgando as músicas pelas rádios de Recife.

Mas Mabuse também tocou com Science, na banda Bom Tom Rádio, e fez com ele a música “A Cidade”, também expressão raríssima do fundador do mangue. A música, também liberada por Diego, pode ser ouvida aí em cima.

Mas é claro que, naquela época, também existiam modos de fazer vídeos. Portanto, para finalizar, fica aqui o registro em clipe da primeira versão da música “Etnia”, gravada por Chico Science & Loustal. Aproveita, que o material é raro.